domingo, 21 de maio de 2017

O DIABO QUE TE CARREGUE
Capítulo 14
 
A Invenção da Personificação do MAL

Finalmente chegamos ao último capítulo deste texto. Não por falta de interesse, mas porque, como se vê, isso aqui tem o propósito de ser apenas um texto, não um livro. Há muito o que se dizer sobre a invenção da personificação do mal, sendo o Diabo, Satanás ou não, mas... precisamos terminar com esse texto uma hora. Tentei redigir os capítulos de modo interconectado, apresentando ideias de forma gradativa, para assim facilitar a compreensão geral. Os raciocínios de cada capítulo estão embasados nas conclusões do anterior, e seguem-se em ordem crescente de entrelaçamento. Sugiro, então, que sejam lidos na ordem que se apresentam, pois tentei simular através dessa ordem a forma real como tais pensamentos formaram-se em mim, o mais natural possível. Talvez não tenha conseguido total intento, mas arregacei as mangas e, assim, a exemplo do professor Eustáquio e nosso amigo Bebedouro, não me acovardei. Em homenagem a todos os autores dos livros dos quais eu extraí conhecimentos, vou creditar Carl Sagan, Richard Dawkins, Christopher Hitchens, Geza Vermes, Jomar Fernandes, André Cancian, Shlomo Sand, Sam Harris, Michael Shermer entre outros. Não posso deixar de agradecer ao professor de Grego e Hebraico Fábio Sabino e também ao​ professor de Português Eustáquio; este cearense que, com seus vídeos, não só aprendi, mas me senti motivado a participar de canais ateístas -- canais como desse meu novo amigo: Aparecido Bebedouro, que gentilmente fixa meus textos no seu blogger. Enfim, em homenagem a todos estes seres vivos e mortos que nos deixaram suas obras, vou terminar meu discurso relembrando que: para os ateus, tanto a bondade quanto a maldade, tudo recai tão somente sobre os ombros do arbítrio individual, não sendo possível qualquer espécie de generalização da causa de seu ato que venha abarcar o ateísmo. O termo ateísmo, na verdade, nem mesmo deveria existir. Ateísmo é simplesmente o reconhecimento do óbvio, das evidências, da honestidade intelectual e a verdade empírica. Aliás, é exatamente por causa dessa honestidade intelectual -- e dessa coragem ensinada principalmente nas escolas -- que em nossa sociedade, a palavra ateu tornou-se tão carregada de preconceitos, tão estigmatizada, que chamar um indivíduo de ateu, longe de ser uma mera classificação, parece ser na verdade uma espécie de insulto, como se fôssemos "satanistas", ou "anti-Cristos". Isso é quase uma regra contra todos aqueles que não comungam das mesmas crenças das quais os crédulos estão escravizados. A única crença (metaforicamente falando) em que nós ateus damos valor é a crença na Ciência -- não à crendice, não de forma sobrenatural. Explicando melhor; damos crédito total a Ciência, não damos crédito algum as religiões, com seus deuses bons e/ou maus. A ideia de que, quem não aceita a existência de Deus está contra Deus é absurda, primitiva e decrépita. O verdadeiro crente não pode descansar enquanto o mundo não se ajoelhar diante disso. Não acreditar no "Demo" ofende tanto quanto não acreditar em Deus. Deus e suas seitas nunca teriam tanto sucesso se não fosse pela invenção da personificação do mal, vulgo Diabo. Um justifica a existência do outro. A Igreja cristã precisa do Diabo muito mais do que os crédulos são capazes de imaginar. Arrisco a dizer que a existência da Igreja depende muito mais do Diabo do que de Jesus. Afinal é o medo que faz com que as ovelhas se juntem, se arrebanhem na crença da proteção e (falsas) esperanças. É o medo somado a covardia intelectual que agrega esses "pobres diabos". A origem mitológica do Diabo como sendo um ser de origem divina é necessária para justificar sua existência, pois se não tivesse poder celeste, como poderia o Diabo continuar desafiando Deus permanentemente? Como? A resposta é muito simples: criar, assim como foi feito com o próprio Deus Javé, uma imagem e personificação do Diabo. Ainda que seja razoavelmente impossível lutar contra um Deus onisciente, atributo não dado ao pobre Diabo. Mas os crédulos nem percebem essa incoerência, coitados. "No mundo assombrado pelos demônios em que habitamos em virtude de sermos humanos, talvez seja apenas isso o que se interpõe entre nós e a escuridão circundante", disse Carl Sagan.

O criador do mal está mais próximo e íntimo de nós do que imaginamos; olhe-se no espelho e reflita.

A "salvação" do desconhecido não está em acreditar em fábulas, mas em nunca reprimir nossas dúvidas pelo medo; o medo da morte. Só nos resta uma única e verdadeira "salvação": viver plenamente a vida. A esperança de todo ser vivo, pensa um racional, é continuar vivo. Esta sim é a verdadeira esperança, afinal, a vida depois da morte não deve ser muito pior que a vida antes do nascimento.

As lacunas do desconhecimento costumam ser preenchidas por sólidas crenças, que serão defendidas, custe o que custar. A religião é um consolo íntimo com alto risco de infâmia coletiva. Quando uma pessoa sofre de um delírio, chamamos isso de insanidade; quando pessoas sofrem de um delírio coletivo, isso é religião.

Para ser um satanista você não precisa fazer absolutamente nada; basta você não acreditar que Satanás existe. A maioria dos cristãos espalham que o maior trunfo de Satanás é levar as pessoas a acreditar que ele não existe. Assim, se você não acredita que Satanás existe, você está sendo enganado por Satanás; você indiretamente é um seguidor de Satanás, logo você já é um satanista, e não se fala mais nisso!

"A razão deveria ser destruída em todos os cristãos. Ela é a maior inimiga da fé. Quem quiser ser um cristão deve arrancar os olhos da razão"

"É impossível para o cristão e para a verdadeira Igreja subsistir sem derramar sangue, pois seu adversário, o Diabo, é assassino e mentiroso. A Igreja cresce e progride através do sangue; e ela está banhada de sangue"
"Os loucos, aleijados, cegos e mudos são homens em quem os demônios fizeram sua morada. Os médicos que curam estas enfermidades como se tivessem causas naturais são idiotas ignorantes (!)".

Frases de Martinho Lutero (1483-1546), considerado o pai do protestantismo.

A religião é aquela esfera de pensamento na qual o ser humano mostra tanto o seu melhor lado heróico quanto seu pior lado trágico. O homem sente certa segurança ao permanecer de acordo com o senso comum. Ele assim determina a si mesmo e aos seus filhos uma subserviência mental ou psicológica ao consenso estabelecido em sua vida religiosa. Isso é somado um abandono virtual daquilo que torna o homem único; a faculdade da razão e o desejo consciente por​ conhecimento.

O sono da razão produz monstros, e a falta de mudanças produz o sono da razão. Como se vence os demônios? Como escapar da condenação divina? Resposta mais simples, impossível: não é que o bem não pode existir sem o mal, mas que o bem não é necessário sem o mal, simples assim.
 

Texto de Richard Hoffman

Nenhum comentário:

Postar um comentário