segunda-feira, 24 de abril de 2017


O DIABO QUE TE CARREGUE

Capítulo 10
A Invenção da Personificação do MAL

Tanto o bem quanto o mal no Antigo Testamento as pessoas atribuíam à Deus quando vindo de tragédias naturais, como no caso do furacão que destruiu a família de Jó, ou quando o mal era praticado pelas pessoas. Porém o mal jamais acontecia pela vontade de alguma outra divindade que não Deus. Javé faz questão de deixar isso bem claro. Ai daquele que duvidasse! Não existia a figura do Diabo, pois as pessoas nem mesmo tinham um conceito de Diabo como nós temos hoje, que na verdade, começou a ser construído no pré-cristianismo do século I. Quem trouxe essa luz de que Deus não praticou e nem pratica o mal, e que em Deus não há maldade, que em Deus não há pecado e que em Deus não há escuridão foram os autores do Novo Testamento, mais tarde, (como já foi dito) na pessoa de Jesus. Foi uma construção que teve seu cerne no Concílio de Nicéia, em 325. Foi a partir daquela época que se começou a construção da imagem e da figura do mal: o Diabo. Se para os cristãos o único Deus que Jesus conhecia era o mesmo Deus do Antigo Testamento, e se ninguém vai a esse "Pai" se não for por Jesus e, principalmente se esses cristãos católicos e protestantes acreditam mesmo até hoje que Jesus é o mesmo Deus borrifado de sangue do Antigo Testamento, então os devotos de Javé (e todos aqueles que tomam a Bíblia como um livro sagrado e a palavra imutável de Deus) deveriam sim atribuir ao seu Deus -- e por extensão à Jesus, o Cristo -- tudo o que aconteceu e acontece, tanto o bem como o mal, correto? Até porque, o judeu Jesus deixa claro que não veio para abolir a Lei dos profetas, e sim afirmá-la (Mt 5:17-18), muito menos trazer a paz, mas a discórdia e a espada (Mt 10:34); tal Pai, tal Filho? Era pra ser, mas, se analisarmos o Novo Testamento como um todo, veremos que há uma mudança drástica entre o Deus Javé e o Cristo. Sim, certas coisas precisam mudar... para continuar as mesmas.


Hoje um terço dos humanos acreditam que, se alguma coisa de ruim existe, vem do Diabo!

Se vem do Diabo, isso é ideologia após o Antigo Testamento. Porque quando você procura explicação de como se originou a figura diabólica do mal antes do Novo Testamento você não tem. Se Satanás era um anjo que se tornou Diabo, a questão é: COMO? Quando o ser humano quer uma resposta e tenta encontrar fundamento onde não há fundamento, ele acaba entrando na concepção da fé. E quando se chega a esse ponto de ideologia, não há mais razão a ser discutida. Porque se eu vou colocar o que eu acho no papel (e papel aceita qualquer coisa), eu não deveria me sentir no direito de exigir que meus filhos tomem esse "achismo" como verdade, como fato. E muito menos deveria pregar esse tipo de coisa como verdade absoluta, divinamente inspirada.

Tudo isso parece moralmente óbvio, mas a maioria de nós age no sentido contrário da razão.

A Ciência é honesta e está a disposição do homem para torná-lo melhor. A fé, ao contrário, penetra pelas lacunas da ignorância, pelo medo, pelo egoísmo e pela covardia intelectual. E tudo isso é explorado covardemente pelos charlatões da fé e das respostas fáceis.


Claro que, para os cérebros já iniciados numa cultura impregnada de tradições e crendices fica realmente difícil escapar da fé, do dogmatismo e da doutrina caprichosa dos pais, e/ou por uma sociedade doente, religiosamente prostituída. Os fiéis, em sua grande maioria, se convencem facilmente pela ginástica teológica dos pregadores, impedindo o raciocínio lógico de seu rebanho com o único propósito totalmente nefasto a humanidade: manter o povo entorpecido e hipnotizado por falsas esperanças e salvação contra inferno.

Uma religião nunca funciona tão bem quanto aquelas que exploram, além da ignorância, o egoísmo, usando chantagens emocionais e o medo do sobrenatural com suas ameaças, tanto do Diabo quanto de (principalmente) Deus. A Invenção de um justifica a Invenção do outro, e os dois juntos justificam as barbáries e insanidades humanas motivadas pela existência de ambos. A inexistência​ do Diabo seria como um "rebelde-sem-causa para a fé. A igreja depende do Diabo, da figura do Diabo. A igreja se apresenta como a casa de Deus, para nos proteger, não somente do próprio Diabo mas também dos hereges infiéis, que não acreditam nem que Deus e nem que o Diabo existem (aqueles ateus desgraçados!).

Não é óbvio, diz o devoto, que a autoridade religiosa está acima de tudo, e que aqueles se recusam a reconhecer isso abrem mão do direito de existir? Pois quem não está com Deus está contra Deus; está com o Diabo; está contra "nós"; é do Diabo.


Doutrinar esse medo ao próximo desde bebê, é manipulador, é cruel, é diabólico. Em vez disso, deveríamos estimular as nossas crianças a arte, o método científico, e estudar as razões para uma declaração de direitos. Há maravilhas e maldades demais lá fora, sem que precisemos inventar outras. No mundo assombrado pelos demônios em que habitamos, em virtude de sermos humanos, talvez seja apenas isso o que se interpõe entre nós e a escuridão circundante.


O melhor para quem não haja trapaças é não haver otários.

Texto de Richard Hoffman

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